O Incorrigível Craque de Futebol

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O HOMEM era um fenomenal craque de futebol. “Escapava com a bola, driblava todo mundo e fazia gol”.

As multidões deliravam com as suas proezas. Arrancava frenéticos aplausos e conquistava milhões de admiradores. Era rara a peleja em que não fazia, pelo menos, um gol.

Acontece, porém, que o técnico da equipe – homem experiente e conhecedor profundo de futebol – não cansava de adverti-lo quanto aos inconvenientes desse jogo individual. De acordo com a boa técnica, o craque não devia apenas preocupar-se em driblar os adversários, escapar coma  pelota e fazer gol. Precisava passá-la aos companheiros de seu quadro, para que, assim, num jogo articulado, de inteligente combinação, atingissem a meta contrária mais seguramente, sem provocar a excessiva fadiga ou o esgotamento de nenhum jogador.

Mas, o nosso herói era vaidoso e incorrigível. Continuou preferindo monopolizar a bola e os aplausos do público. Como se tratasse de ótimo jogador e de um ídolo das multidões, o técnico ia tolerando a indisciplina, embora chamando a atenção do craque, de vez em quando.

Certo dia, porém, quando o exímio chutador estava prestes a fazer o terceiro gol, numa de suas escapadas fulminantes, um dos zagueiros da equipe adversária aplicou-lhe violentíssimo pontapé. O nosso herói foi retirado do campo e internado de um hospital, onde permaneceu em tratamento durante alguns meses. Diziam que esse pontapé fora proposital, pois o que se queria era afastar da cancha, de qualquer modo, o perigo atacante que já marcara dois tentos.

O incorrigível craque de futebol nunca mais voltou aos gramados, não porque tivesse ficado fisicamente inutilizado, mas porque perdeu a atração por esse desporto. Talvez com receio de sofrer outra violenta agressão. Talvez porque não se conformasse com a idéia de que deveria, mesmo, abandonar aquela atuação exclusivamente individual.

Compreendeu, no entanto, que eram sensatas e valiosas as advertências do técnico de seu clube, pois, num jogo de passes constantes, realiza-se um trabalho de equipe, sem que nenhum jogador fique tão marcado como ele ficara.

O que se conclui é que, seja qual for a atividade no gramado da vida cotidiana, ninguém deve embriagar-se com os aplausos e os louros da vitória, ao ponto de não dar atenção aos conselhos dos mais experientes.

Por outro lado, serve pra nos alertar quanto aos perigos do exclusivismo, quando a presunção leva o Ser Humano à superestima de si mesmo e ao menosprezo da ajuda de seus semelhantes, até abandoná-lo inteiramente.

Faz lembrar, também, o pensamento de Unamuno: “Os Homens verdadeiramente fortes são os que sabem coordenar seus esforços com os dos outros”.


Extraído de:

Jornal Verologia

Ano XXXII Nº 403 e 404
Artigo referente a Julho e Agosto de 2006

 

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